terça-feira

Mulher e garrafa

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Sabia realmente o que se passava naqueles arredores e, naquele boteco encanecido e execrável que eu tomava conta durante o dia e noite, e que era intensamente freqüentado por embriagados, desertores da vida. Passava-me por homem durão; nunca fiado. Sabia que se vacilasse estaria perdido. E simplesmente me perdi:
Entrou-me no boteco uma mulher loura divina, olhos esverdeados, pele lisa, doce e, aparentemente macia, lábios agressivos e avermelhados. As madeixas louras caiam-lhe sobre os ombros que esticavam longos braços, os quais se curvavam ao redor da fina cintura traçada por um cinto negro. O colo descoberto era sutilmente majestoso. Os seios eram fartos, trajava-lhe o corpo um vestido curto de tecido retalhado branco com as laterais bordadas em vinho e branco, escondia-se atrás de uns óculos escuros com as lentes espelhadas em tom de mel. Possuía um olhar perspicaz e atencioso por trás das lentes como um fogo ardente e de chama causadora de alienação.
Dirigiu-se ao balcão lentamente, caminhando como se desfilasse em Hollywood com estrelas incentivando-lhe os passos longos e macios ao tocar o chão. Passou a língua sobre os lábios, olhou meio que de canto de olho os quadros velhos, debruçou os seios sobre o balcão esparramando-os de forma exibicionista, parou o olhar de repente em minha face redonda e, sacudiu os cabelos lentamente como se quisesse desimpedi-los da prisão e joga-los ao vento feito pelo ventilador de canto.
Totalmente me observando, falou-me delicadamente :
- Por favor, leva-me até a mesa uma garrafa com cerveja.
- Sim é claro. Aguarde um instante . – respondi batendo dentes de apreensão.
- Bem, aguardarei.- e retrocedeu á mesa .
Fiquei abismado com aquela formosura e educação no boteco velho e malcheiroso cujo, como já disse só habitavam bêbados invalidados pela vida e pessoas desencorajadas pela mesma . Pensei até que queria fiado mais era muito refinada e cultivada, não poderia ser capaz, recatava-me com aquele jeito dissimulado, mas parecia somente um jeito de mulher. Possuía face de perdida flor pela cidade atrás de algo á beber. Era uma madama ou senhorita? . Optei por senhorita, mais ocasional, madama seria muito puxa-saquismo, ou intenções de cortejo descarado e de elegância nunca convencional a um boteco de esquina .
Apanhei a melhor cerveja que havia no estoque das misérias, e levei-a rapidamente ás mãos de senhorita.
- Senhorita, aqui está sua cerveja
- Obrigada moço, és de bom agrado.
- Deseja algo para degustar, temos diversas coisas ...
- Não, por enquanto não. Obrigada.
O coração saltitava-me alto, deduzi-me um excelente garçom de senhoritas lindíssimas e formosas como aquela. Dono dos galanteios perdidos e dos corações feridos. Poético como o perfume derramado em seu belíssimo colo branco como leite.
Dirigi-me ao balcão bem-aventurado e enamorado com aqueles olhos suntuosos e talvez pretensiosos por uma cobiça ou só uma cerveja .
Ela olhava-me muito, teria gostado das gentilezas? teria atraído-se com meu fino tratamento de cavalheiro?
Da boca , palavras doces tiravam-lhe a timidez e acentuavam-lhe os olhares afetuosos de madama endinheirada . Disse-me que era simpático e, perguntou-me ainda se possuía esposa ou adoraradas perdidas.
- Não senhorita. Não tenho esposa – respondi esperançoso .
- Sério, e adoradas perdidas, quantas têm ?.
- Também nenhuma
- Agrada-me bastante então.
- Sim, agradarei. E você tem alguém?
- Não. Divorciei-me a tempos.
Fiquei boquiaberto com aquelas palavras; ela estava me galanteando realmente. Fiquei excêntrico, era delirante a dama, senti-me lisonjeado e pulcro. Teria uma mulher? -Quem saberia.
- traze-me um pastel de carne, mas frito na hora .
- Sim senhorita. Irei traze-lo em instantes .
- Tudo bem fofo.
Fofo, meu deus não acreditava naquilo, era fantasia, só havia ser uma. Apressei-me, fritei o pastel rapidamente, pois já estava com lembranças daquele semblante esplêndido, iria pergunta-lhe o nome e, arrancar-lhe o número telefone na volta. Seria homem, o seu rei, e ela mulher, minha rainha .
Mas foi naquele instante de raciocínio que percebi que ela cortejava-me, mas, estranhamente não me havia perguntado o nome e, por traz daquele rosto só havia de ter algum interesse escondido. Era demais dissimulada. Algo se errava ali, era um feio e pobre, que interesse poderia despertar em uma dama divina como aquela.
Passei da mão pro prato o pastelão desconfiado ligeiramente das investidas da fêmea ouriçada e desfechei para frente ansiosamente através de caminhares alongados e preocupados pela confiança que depositara na dama. Corria o sangue nas veias abrasador, minha vida era resumida naquela dama que me aparecera diante dos olhos como um cálice de vinho, uma flor campestre, uma passarinha cantadora, uma chance de ser feliz.
Dirigi-me através do metediço olhar á mesa do fundo que madama havia se sentado. E naquele meu ansioso olhar, ingênuo e venturoso, lá estava; linda, doce, meiga e singela, a garrafa vazia rotulada cerveja.

5 comentários:

Anônimo disse...

gostei muito da forma como escreve . rápido e sem perder a magia da coisa...

ganhou um leitor :)

Gabriela Nieri disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Gabriela Nieri disse...

Adorei .

quando li, senti o 'machismo'. haha


parabéns :)

Com nome ou sem... disse...

Por que você faz isso? Por que escreve assim? Dessa maneira, falando de uma mulher que não quer nada além satisfazer seus desejos? Sem se importar se está enganando ou não? Por que colocaste o homem só vacilando diante de uma mulher que aparentava viver num mundo diferente do dele? Por que colocas uma loira para fazer esse papel? Acaso não sabes como eu penso? Ou, pior ainda, não sabes que fazendo tudo isso me obrigas a dizer que gostei muito desse texto?

Com nome ou sem... disse...

Ficou ótimo!!!